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13 março 2010

72. Romaria

Quando uma viola canta no sertão há sempre a certeza de que aqueles acordes expressam a alma de uma gente. De uma gente que canta (apesar das agruras da vida) e é feliz. Uma moda de viola e as canções sertanejas são sempre uma entrega pessoal, que tenta imprimir o coletivo.
Em "Romaria" (Romaria, 1978), Renato Teixeira registra o sujeito simples e sincero que, não sabendo rezar, mas confiando no poder de Nossa Senhora Aparecida, quer, ao menos, dar à santa o olhar.
O olhar (o olho como janela da alma) é o que de melhor o sujeito sofrido, mas com fé e alegria, pode presentear a santa que lhe protege de dores maiores. O olhar traduz, guarda e imprime a honestidade dos sentimentos.
Um roda de viola caipira diz muito de nossa vocação brasileira para fazer do pó, de uma vida cumprida a sol, a estrada de uma vida iluminada. "Romaria" canta-nos pelo lado de uma felicidade prenha de conformação. A voz coletiva e épica do sujeito - pai peão e mãe solidão - se compraz em saber pequena diante da imagem santa.
Apesar de a princípio o sujeito descrer de tudo, ele se entrega. As romarias guardam um segredo ainda indecifrável: uma crença no futuro. O sujeito que nunca viu a sorte, incentivado pela fé coletiva - "me disseram porém que eu viesse aqui" -, rende-se à padroeira e se desnuda buscando encontrar a sabedoria (e algum sentido) da existência.

***

Romaria
(Renato Teixeira)

É de sonho e de pó, o destino de um só
Feito eu perdido em pensamentos
Sobre o meu cavalo
É de laço e de nó, de gibeira o jiló,
Dessa vida cumprida a sol

Sou caipira, Pirapora Nossa
Senhora de Aparecida
Ilumina a mina escura e funda
O trem da minha vida

O meu pai foi peão, minha mãe solidão
Meus irmãos perderam-se na vida
Em busca de aventuras
Descasei, joguei, investi, desisti
Se há sorte eu não sei, nunca vi

Me disseram porém que eu viesse aqui
Pra pedir de romaria e prece
Paz nos desaventos
Como eu não sei rezar, só queria mostrar
Meu olhar, meu olhar, meu olhar

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