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24 julho 2010

205. Se...

Ah, se a vida fosse diferente; se todos os sonhos virassem realidade; se as relações interpessoais fossem perfeitas (mesmo que nem saibamos o que seja perfeição); se a pessoa amada voltasse em três minutos (depois de uma briga); se tivéssemos escolhido caminhos diferentes; se aquela canção tocasse na hora certa... Mas não é assim. Talvez, por isso, precisamos tanto da ficção: da vida mais real.
O "se", de certa forma, é aquilo que, não tendo sido consumido (e consumado), impulsiona o indivíduo para frente. Ou seja, podemos tomar o "se" como um estímulo para continuar na busca da realização do desejo.
Porém, o "se" pode também servir de entrave, caso o indivíduo pare: remoendo aquilo que não foi (chafurdando em sobras de sonhos) sem perceber as possibilidades do que pode ser e está sendo. O "se" pode ser, portanto, um olhar para frente ou para trás, ou mais.
O "Se" criado por Djavan (Coisa de acender, 1992) canta uma relação amorosa que pode ser feliz, mas, como toda relação depende de (no mínimo) dois, o sujeito fica esperando (questionando) uma posição do outro.
Amar, por mais batida que esta expressa possa ser, é correr riscos. Nunca sabemos, ao certo, o quanto o outro gosta de nós. Assim como não sabemos precisar o nosso gostar pelo outro. O sujeito de "Se" caminha sobre a navalha: aquele risco que acende a coisa toda do afeto.
Entre o sim e o não, o outro, da canção, prefere o talvez (o se): perturbando o juízo do sujeito, que, com a ajuda do santo guerreiro, conclui: "quer saber? quando é assim, deixa vir do coração". O negócio é se entregar e ver no que dá: se dá ou não.
De noite na cama, enquanto o sujeito queima de desejo, o outro quer dormir. As imagens (metáforas) que Djavan lança na letra, unidas à melodia malemolente, estabelecem o clima de desejo, convite e dificuldade: o embate erótico noturno.
O convite, claro, é para que o outro, assim como o sujeito, "solte a louca e arda de paixão": façamos, vamos amar - me deixa gozar e goze junto. Largue a mão do não; desça do muro: diga sim a nós.

***

Se...

(Djavan)

Você disse que não sabe se não
Mas também não tem certeza que sim
Quer saber?
Quando é assim
Deixa vir do coração
Você sabe que eu só penso em você
Você diz só que vive pensando em mim
Pode ser
Se é assim
Você tem que largar a mão do não
Soltar essa louca, arder de paixão
Não há como doer pra decidir
Só dizer sim ou não
Mas você adora um se

Eu levo a sério mas você disfarça
Você me diz à beça e eu nessa de horror
E me remete ao frio que vem lá do sul
Insiste em zero a zero e eu quero um a um
Sei lá o que te dá, não quer meu calor
São Jorge por favor me empresta o dragão
Mais fácil aprender japonês em braile
Do que você decidir se dá ou não

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