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19 novembro 2010

323. Pra você eu digo sim

As canções de Rita Lee são daqueles tipos de peças que imprimem (no ouvinte) a beleza de viver pelo simples sabor do gesto de viver: com muito auto bom humor e autoironia.
A propósito, importa destacar a biografia alucinada da rainha do rock: Rita Lee mora ao lado, escrita com competência e paixão por Henrique Bartsch, em que se sugerem as personas que bailam sob o (des)controle da lúdica sereia Rita Lee. A biografia é tão cheia de significantes quanto a biografada.
Em Aqui, ali, em qualquer lugar (2001), Rita Lee recupera sua paixonite pelos Beatles: refrigera com bons ares de juventude uma obra, por si, jovial: afirmativa e alegre, no sentido que não nega a dor e a melancolia.
Temos o privilégio de ouvir como a menina que cantou "Canção para inglês ver" traduz e transcria (voz, letras e melodias) as canções britânicas (e universais).
A liberdade tropical e oswaldiana com que Rita ouve e lê as canções imprime a certeza de seu diálogo amoroso com os ídolos do início de sua caminhada no mundo das canções; ao mesmo tempo em que apresenta-os, renovados e destronados (sem a pecha de seres intocáveis), aos ouvintes de hoje. Isso, de viés, amplia o sabor das canções: oferece novas cores.
Desde o suspiro inicial até o sim final da canção "Pra você eu digo sim", versão de Rita Lee para "If I fell", de John Lennon e Paul McCartney, há uma luxúria toda humana e feminina: de uma mulher que responde ao sujeito machista da canção "Minha namorada" que: "Se você quiser ser meu namoradinho e me der o seu carinho sem ter fim, pra você eu digo sim".
Ou seja, deixando suspendida a resposta para a pergunta freudiana - "afinal, o que querem as mulheres?" - o sujeito feminino da canção impõe seus desejos, revelando suas incertezas. E é este jogo entre inseguranças e vontades que faz a graça da canção: revela a mulher que canta seu homem, sem dizer que sim, nem que não: preservando o "se" e seduzindo quem ouve seu canto de sereia manhosa.
No fundo, ela não quer repetir velhos erros: uma vez ela se apaixonou e não foi como ela pensou. Daí os receios e as regras que ela deixa minar. Mulher esperta, ela não quer ser nem fácil, nem defensiva: quer apenas fazer valer um mundo só dos dois, afinal o mundo não precisa de mais ninguém, depois da entrega total.
Ele, o outro, o pretenso namoradinho, é a motivação para o canto; por isso, se ele cumprir sua parte no jogo - dar abraços e beijinhos e carinhos sem ter fim -, ela diz sim: afirma a vida junto dele, aqui, ali, em qualquer lugar.

***

Pra você eu digo sim (If I fell)
(John Lennon / Paul McCartney - versão Rita Lee)

Se eu me apaixonar
Vê se não vai debochar
Da minha confusão
Uma vez me apaixonei
E não foi o que pensei
Estou só desde então

Se eu me entregar total
Meu medo é
Você pensar que eu
Sou superficial

Se eu não fizer
Amor assim sem mais
Se você brigar
E for
Correndo atrás de alguém
Não vou suportar
A dor de ver
Que eu perdi
Mais uma vez meu amor

Mas se eu sentir
Que nós estamos juntos
Longe ou a sós
No mundo e além
Pode crer que tudo bem
O amor só precisa de nós dois
Mais ninguém

Se você quiser
Ser meu namoradinho
E me der o seu carinho
Sem ter fim
Prá você eu digo sim

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