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25 outubro 2010

298. O trem azul

A comparação entre vida e viagem atravessa nosso cancioneiro. Somos passageiros de um trem, sempre em direção à próxima, e nova, estação, com suas promessas de momentos mais felizes. Encontros e despedidas equilibram a existência: ampliam a fragilidade do canto daquilo que não sabemos mais definir se é real ou ficcional: tão imbricados estão.
"O trem azul", de Lô Borges e Ronaldo Bastos, com sua melodia alegre, com o sol na cabeça, é o canto da esperança nos bons encontros que a próxima estação trará; é canto de afirmação (inclusive das despedidas) da beleza da palavra, afinal, a tristeza é resultado das palavras que não foram ditas: e que devoram o indivíduo por dentro.
A canção está guardada no emblemático disco Clube da esquina (1972). Para Santuza Cambraia Naves, no livro Canção popular no Brasil: "ainda que não chegasse a configurar-se como um movimento, o chamado "Clube da esquina foi uma tendência da música popular brasileira com características próprias. (...) Os ritmos variados e letras que celebravam recantos de Minas Gerais evocavam um certo clima contracultural e ao mesmo tempo protestavam contra o movimento político opressor que o país atravessava".
O sujeito de "O trem azul", cantando a paisagem da janela lateral do quarto de dormir, observa a possibilidade de dias luminosos: com muito azul em torno do outro: destinatário e ouvinte da canção.
Cantor, como, no fundo, cada um de nós é (ou deve ser), da vida, o sujeito sabe que suas frases são levadas pelo vento (que é o grande manipulador dos sons: da canção que não se cansa de voar), mas não deixa que a potência se perca: direciona seu canto, mexendo nas "coisas que ficaram muito tempo por dizer", construindo um canto que condensa o passado, o presente ("você pega o trem azul") e o futuro ("um sol na cabeça") do outro.
O sujeito compõe uma "Canção amiga": ao mesmo tempo em que observa o amigo, estimula-o a seguir em frente, sem perder o brilho. Ao modo do sujeito do poema de Drummond, o sujeito de "O trem azul" mostra que, nesta longa estrada (de ferro) da vida, "aprendeu novas palavras e tornou outras mais belas": paixão e fé, no SIM, são duas delas.

***

O trem azul
(Lô Borges / Ronaldo Bastos)

Coisas que a gente se esquece de dizer
Frases que o vento vem as vezes me lembrar
Coisas que ficaram muito tempo por dizer
Na canção do vento não se cansam de voar
Você pega o trem azul, o Sol na cabeça
O Sol pega o trem azul, você na cabeça
Um sol na cabeça

Um comentário:

Anônimo disse...

Lindo!!!! O Trem Azul é A poesia!