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10 junho 2010

161. Mutante

Dizer "eu te amo" é um fim ou um meio? Ou seja, quando digo "eu te amo" estou querendo fotografar meu sentimento, independente do retorno afetivo (um fim)? Ou estou querendo ouvir do outro (destinatário da frase) a mesma declaração (um meio)? A resposta para esta pergunta é cruel, mas libertadora.
Em "Mutante", Rita Lee e Roberto de Carvalho (Saúde, 1981) desenham um sujeito que tenta se adaptar (mutante que é) aos revezes da relação com o outro, mas deixa vazar certa amargura motivada pela falta de reciprocidade na entrega dos desejos.
Como é característico na obra de Rita Lee, elementos lúdicos são convidados para montar uma mensagem ao mesmo tempo lúdica e reflexiva. Anel de brilhantes e coração são comparados (postos em equivalência) a fim de indiciar aquilo que é precioso para cada um dos parceiros.
Romântica, o sujeito da canção cobra do outro os mesmos investimentos feitos por ele, indicando um amor que ama para ser amado - romântico. O amor pelo outro é um meio de ter o amor do outro para si. Humano e carente profissional, o sujeito tateia no meio da bugiganga os tais caquinhos de um mundo que ele tentou construir.
Sempre lúdica e irreverente (na tentativa de desobstruir a linearidade assertiva da língua) Rita joga com a sonoridade das palavras - "você não me kiss", por exemplo - condensando forma e conteúdo e detonando significações outras, para além do que está sendo ouvido: para a escrita. No caso, podemos imaginar o bilhete (dolorido, visto que "um pouco rejeitada", com "nó na garganta") de despedida. Afinal, como mutante, "eu passo pra outra", canta. Não sem antes ameaçar certo roubo.

***

Mutante
(Rita Lee / Roberto de Carvalho)

Juro que não vai doer se um dia eu roubar
o seu anel de brilhantes
afinal de contas dei meu coração
e você pôs na estante
como um troféu
no meio da bugiganga
você me deixou de tanga
Ai de mim que sou romântica

Kiss baby kiss-me, baby kiss-me
Pena que você não me kiss
Não me suicidei por um triz
Ai de mim que sou assim

Quando eu me sinto um pouco rejeitada
me dá um nó na garganta
Choro até secar a alma de toda a mágoa
depois eu passo pra outra
Como mutante
no fundo sempre sozinho
seguindo o meu caminho
Ai de mim que sou romântica

Kiss baby kiss-me, baby kiss-me
Pena que você não me kiss
Não me suicidei por um triz
Ai de mim que sou assim

2 comentários:

Simone Santos disse...

Perfeito como sempre, seus posts são demais, esse vou compartilhar em meu facebook, adorei!!! Parabéns!!!

IsaBele disse...

Olá! Hj eu vim para casa ouvindo sua entrevista na MPB FM, e mal cheguei liguei o pc pra conhecer seu blog. E como curto muuuito música brasileira, gostei muito do seu lugar, viu? E fiquei a imaginar que gostoso não deve ser estudar essas maravilhas.
Estarei sempre por aqui... E espero que esses deliciosos posts não findem aos 365.

Abraços!