"Grávida", de Marina Lima e Arnaldo Antunes, guardada no disco Marina Lima (1991), é uma canção que liga o homem romântico, registrado pelo lirismo (presença recorrente e cortante do "eu") e a abstração. "Grávida" é mais sensação do que representação.
O sujeito brinca com o suposto desenho de si para plasmar um desenho surreal do humano. Ele suspende o conhecimento ordinário sobre a gravidez anexando em si os lugares desencarnados que as tecnologias nos oferecem.
Cheio de tudo, grávida do excesso tecnológico da vida contemporânea, o sujeito pari - no abrir e fechar dos dias - os resultados da combinação dos resíduos doados pelo macho fecundador (o progresso?) e o corpo orgânico do sujeito que canta sob o som de uma melodia sensual e envolvente.
Há uma justaposição de elementos naturais e artificiais apontando um objeto que é mais que humano: é pós. Combinados, os elementos não se esboroam, não se amalgamas e não se perdem de vista por completo, pois querem dizer de si enquanto engendram o canto do sujeito.
Pesado e leve (furacão e bolha de sabão) se equilibram a fim de tencionar o estado de saturação do sujeito enunciador. Seguindo esta linha de pressupostos, podemos ouvir um sujeito desencarnado, sem carne e cambiante: apontando para a multiplicidade de códigos que atravessam aquilo que hoje ainda chamamos de humano.
Cada imagem apresentada (cada elemento trazido à cena) aponta torres de Babel, babilônias, sodomas, gomorras e atlântidas que se montam e se desfazem dentro do sujeito. A disposição desordenada de materialidades é, no final, a causa do encantamento possível, diante das crias paridas desta harmonia dissonante que é o sujeito da canção.
A pele é curta para tamanhas descobertas, pois o sujeito não cabe mais em seu baú de ossos. Ele divide e une, capta e pulveriza. Aqui, a plasticidade evoca o humano perdido na profusão de significantes, mas dá vida a um novo humano.
Ele se dá à luz: ilumina a si mesmo; canta sua anatomia selvagem dos detalhes das sugestões exteriores que, de fato, lhe constituem. O ato sexual ausente dispara: o sujeito se multiplica para sentir a vida se fazendo vida dentro dele?
Seu corpo docilizado está a serviço de sentir tudo de todas as maneiras. E ele distingue no meio da beleza da gravidez os sonhos intranquilos que lhe fazem estar grávida de palavras. É pela ausência delas, ou pela inexistência das palavras certas para cada sentimento, que o sujeito pensa e canta.
Cheio de tudo, grávida do excesso tecnológico da vida contemporânea, o sujeito pari - no abrir e fechar dos dias - os resultados da combinação dos resíduos doados pelo macho fecundador (o progresso?) e o corpo orgânico do sujeito que canta sob o som de uma melodia sensual e envolvente.
Há uma justaposição de elementos naturais e artificiais apontando um objeto que é mais que humano: é pós. Combinados, os elementos não se esboroam, não se amalgamas e não se perdem de vista por completo, pois querem dizer de si enquanto engendram o canto do sujeito.
Pesado e leve (furacão e bolha de sabão) se equilibram a fim de tencionar o estado de saturação do sujeito enunciador. Seguindo esta linha de pressupostos, podemos ouvir um sujeito desencarnado, sem carne e cambiante: apontando para a multiplicidade de códigos que atravessam aquilo que hoje ainda chamamos de humano.
Cada imagem apresentada (cada elemento trazido à cena) aponta torres de Babel, babilônias, sodomas, gomorras e atlântidas que se montam e se desfazem dentro do sujeito. A disposição desordenada de materialidades é, no final, a causa do encantamento possível, diante das crias paridas desta harmonia dissonante que é o sujeito da canção.
A pele é curta para tamanhas descobertas, pois o sujeito não cabe mais em seu baú de ossos. Ele divide e une, capta e pulveriza. Aqui, a plasticidade evoca o humano perdido na profusão de significantes, mas dá vida a um novo humano.
Ele se dá à luz: ilumina a si mesmo; canta sua anatomia selvagem dos detalhes das sugestões exteriores que, de fato, lhe constituem. O ato sexual ausente dispara: o sujeito se multiplica para sentir a vida se fazendo vida dentro dele?
Seu corpo docilizado está a serviço de sentir tudo de todas as maneiras. E ele distingue no meio da beleza da gravidez os sonhos intranquilos que lhe fazem estar grávida de palavras. É pela ausência delas, ou pela inexistência das palavras certas para cada sentimento, que o sujeito pensa e canta.
***
Grávida
(Marina Lima / Arnaldo Antunes)
Eu tô grávida
Grávida de um beija-flor
Grávida de terra
De um liquidificador
E vou parir
Um terremoto, uma bomba, uma cor
Uma locomotiva a vapor
Um corredor
Eu tô grávida
Esperando um avião
Cada vez mais grávida
Estou grávida de chão
E vou parir
Sobre a cidade
Quando a noite contrair
E quando o sol dilatar
Dar à luz
Eu tô grávida
De uma nota musical
De um automóvel
De uma árvore de Natal
E vou parir
Uma montanha, um cordão umbilical, um anticoncepcional
Um cartão postal
Eu tô grávida
Esperando um furacão, um fio de cabelo, uma bolha de sabão
E vou parir
Sobre a cidade
Quando a noite contrair
E quando o sol dilatar
Vou dar a luz
(Marina Lima / Arnaldo Antunes)
Eu tô grávida
Grávida de um beija-flor
Grávida de terra
De um liquidificador
E vou parir
Um terremoto, uma bomba, uma cor
Uma locomotiva a vapor
Um corredor
Eu tô grávida
Esperando um avião
Cada vez mais grávida
Estou grávida de chão
E vou parir
Sobre a cidade
Quando a noite contrair
E quando o sol dilatar
Dar à luz
Eu tô grávida
De uma nota musical
De um automóvel
De uma árvore de Natal
E vou parir
Uma montanha, um cordão umbilical, um anticoncepcional
Um cartão postal
Eu tô grávida
Esperando um furacão, um fio de cabelo, uma bolha de sabão
E vou parir
Sobre a cidade
Quando a noite contrair
E quando o sol dilatar
Vou dar a luz