A sereia mitológica tem um poder instigante: ao menos tempo em que o seu canto arrasta o sujeito para a morte da subjetividade, também, enquanto dura, sustenta a vida, pois é um canto que canta a vida individual e intransferível.
Pensando deste modo, as pessoas se eternizam (não há morte) na medida em que, em nosso pensamento, elas continuam presentes (vivas). Cantar o outro é mantê-lo, como a lua rodando entre as estrelas, sintonizado à nosso ser.
Pelo contrário, matar o outro é parar de cantá-lo: o silêncio. Matar é esquecer. Quando uma mãe, diante da morte de um filho, dilacerada, afirma que ele está mais vivo do que nunca é porque ela continua mimando-o e cantando-o em seu seio maternal.
Daí também a expressão popular: "falem bem ou falem mal, mas falem de mim". Ou seja, cantem-me, mantenham-me aceso na memória e no pensamento, sustentem-me na vida. Silêncio e morte estariam, assim, intimamente ligados.
Do mesmo modo, o fim das relações erótico-afetivas. O outro estará vivo em nós enquanto sua presença permanecer pulsando em nós, enquanto algo (ou alguma coisa) dele estiver sintonizado com nossa constituição individual. Dito de outro modo, enquanto o canto que vem dele encontrar eco em nós (ou o avesso disso).
Cada indivíduo tem um tempo único e particular ao lidar com o ritmo dos sentimentos: ganhos e perdas. Há, muitas vezes, a completa rejeição ao fim, como se o canto que liga os indivíduos não pudesse chegar ao fim: só de pensar em esquecer, lembra e mantém o outro vivo. É o caso, por exemplo, de "Canção para você viver mais", de John Ulhoa.
Gravada pelo Pato Fu (Televisão de cachorro, 1998), essa canção nos mostra um sujeito na tentativa (toda humana) de manter o outro vivo: quente e presente. O timbre (algo) eletrônico da voz de Fernanda Takai (trabalhada eletronicamente) sugere um equalizador em processo de (des)sintonia: adensando a vontade de permanência da ligação entre o sujeito e o outro cantado.
"Canção pra você viver mais" é metacanção na medida em que se insinua para dentro de si: ao cantar que "faz um tempo eu quis fazer uma canção" o sujeito está, de fato, fazendo uma canção. A canção é "feita" (realizada) enquanto dura sua execução e audição, pelo outro: o destinatário.
O outro (e nós: ouvintes) dura, por sua vez, o tempo da canção. O fim da canção - o silêncio - mata o outro, além de matar (no ouvinte) a voz que canta. O sujeito (a sereia) se empenha (repete várias vezes o verso "pra você viver mais") na manutenção da vida do outro (alguém pra se lembrar) e de si. Afinal, o amor ainda estava lá, nele, no sujeito da canção.
Pensando deste modo, as pessoas se eternizam (não há morte) na medida em que, em nosso pensamento, elas continuam presentes (vivas). Cantar o outro é mantê-lo, como a lua rodando entre as estrelas, sintonizado à nosso ser.
Pelo contrário, matar o outro é parar de cantá-lo: o silêncio. Matar é esquecer. Quando uma mãe, diante da morte de um filho, dilacerada, afirma que ele está mais vivo do que nunca é porque ela continua mimando-o e cantando-o em seu seio maternal.
Daí também a expressão popular: "falem bem ou falem mal, mas falem de mim". Ou seja, cantem-me, mantenham-me aceso na memória e no pensamento, sustentem-me na vida. Silêncio e morte estariam, assim, intimamente ligados.
Do mesmo modo, o fim das relações erótico-afetivas. O outro estará vivo em nós enquanto sua presença permanecer pulsando em nós, enquanto algo (ou alguma coisa) dele estiver sintonizado com nossa constituição individual. Dito de outro modo, enquanto o canto que vem dele encontrar eco em nós (ou o avesso disso).
Cada indivíduo tem um tempo único e particular ao lidar com o ritmo dos sentimentos: ganhos e perdas. Há, muitas vezes, a completa rejeição ao fim, como se o canto que liga os indivíduos não pudesse chegar ao fim: só de pensar em esquecer, lembra e mantém o outro vivo. É o caso, por exemplo, de "Canção para você viver mais", de John Ulhoa.
Gravada pelo Pato Fu (Televisão de cachorro, 1998), essa canção nos mostra um sujeito na tentativa (toda humana) de manter o outro vivo: quente e presente. O timbre (algo) eletrônico da voz de Fernanda Takai (trabalhada eletronicamente) sugere um equalizador em processo de (des)sintonia: adensando a vontade de permanência da ligação entre o sujeito e o outro cantado.
"Canção pra você viver mais" é metacanção na medida em que se insinua para dentro de si: ao cantar que "faz um tempo eu quis fazer uma canção" o sujeito está, de fato, fazendo uma canção. A canção é "feita" (realizada) enquanto dura sua execução e audição, pelo outro: o destinatário.
O outro (e nós: ouvintes) dura, por sua vez, o tempo da canção. O fim da canção - o silêncio - mata o outro, além de matar (no ouvinte) a voz que canta. O sujeito (a sereia) se empenha (repete várias vezes o verso "pra você viver mais") na manutenção da vida do outro (alguém pra se lembrar) e de si. Afinal, o amor ainda estava lá, nele, no sujeito da canção.
***
Canção pra você viver mais
(John Ulhoa)
Nunca pensei um dia chegar
E te ouvir dizer:
Não é por mal
Mas vou te fazer chorar
Hoje vou te fazer chorar
Não tenho muito tempo
Tenho medo de ser um só
Tenho medo de ser só um
Alguém pra se lembrar
Alguém pra se lembrar
Alguém pra se lembrar
Faz um tempo eu quis
Fazer uma canção
Pra você viver mais
Deixei que tudo desaparecesse
E perto do fim
Não pude mais encontrar
O amor ainda estava lá
O amor ainda estava lá
(John Ulhoa)
Nunca pensei um dia chegar
E te ouvir dizer:
Não é por mal
Mas vou te fazer chorar
Hoje vou te fazer chorar
Não tenho muito tempo
Tenho medo de ser um só
Tenho medo de ser só um
Alguém pra se lembrar
Alguém pra se lembrar
Alguém pra se lembrar
Faz um tempo eu quis
Fazer uma canção
Pra você viver mais
Deixei que tudo desaparecesse
E perto do fim
Não pude mais encontrar
O amor ainda estava lá
O amor ainda estava lá
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