"Bastidores", de Chico Buarque, parece ter sido feita para ser cantada por Cauby Peixoto: tamanho é o equilíbrio entre o que é dito e a voz do cantor. Mas não foi, a canção foi feita para Cristina, irmã de Chico.
Porém, Cauby deu à canção um jeito definitivo de interpretá-la: passional, doído e arrebatado. Há, em cada verso, filigranas que, recolhidas no luminoso título - "Bastidores" - desenham a figura do artista em sua solidão excessiva. Não à toa, Rodrigo Faour deu à biografia que escreveu sobre Cauby o título de Bastidores: Cauby Peixoto, 50 anos da voz e do mito.
Guardada no disco Cauby! Cauby! (1980), "Bastidores" canta o trágico, a lagrimalegria e a dor prazerosa na entrega diária e profunda do artista (completo: 24 horas por dia; todos os segundos) que não consegue separar privado e público, posto que um já foi suplantado pelo outro.
A persona criada para si por Cauby Peixoto, cantor da era do rádio, com toda as loucuras e consequências que essa era exerceu sobre os artistas, encarna como ninguém o sujeito de "Bastidores": "preso a canções, entregue a paixões que nunca tiveram fim", com diz a canção "Caçador de mim".
Deus e diva, o sujeito da canção chora até sentir dó de si. E o pior: diz (canta) isso para que o outro saiba e também se comova. Pura atitude romântica da diva que, rodeada de calmantes e excitante, mistura as instância do lar e do palco. Cantor popular, o sujeito leva a vida a cantar. Mas aqui cantar é chorar.
Ele encena o drama das emoções contrastivas: entre perder o amor daquela pessoa especial e ganhar o amor do público. Circular, a canção se apoia na melodia ora ascendente ora descendente para cantar o cotidiano da personagem que fala de si. Aliás, a melodia não se conclui, acaba na 5ª sugerindo o círculo infinito e vicioso de onde o sujeito não consegue sair.
A ênfase na dor é clara: figurativiza o sujeito na encruzilhada entre dois amores - cada qual com uma parcela do sujeito nas mãos. Cauby, além de narrar, dramatiza a dor na voz. A repetição do refrão ajuda a carregar nas cores fortes do sofrimento objeto do canto e seu dilaceramento.
A canção "Bastidores" reafirma a noção romântica de cantor: quanto mais sofre mais bonito canta. Evoca a figura do clown e do assum preto. Enquanto aquele reprime sua tristeza e faz graça para ver o riso do outro; este "num vendo a luz, ai, canta de dor", como sugere a canção "Assum preto", de Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira. A dor como motor do cantar.
O sujeito de "Bastidores" se constrói melodicamente; inventa-se diante dos ouvidos de quem lhe ouve cantar (chorar). Ele se traveste ("com muitos brilhos" e pinturas) para oferecer o melhor de si, mesmo em estado de penúria íntima; usa a máscara que não consegue mais tirar, pois está apegada à carne. Ele agora é todo canção e o sucesso é um mau necessário.
Porém, Cauby deu à canção um jeito definitivo de interpretá-la: passional, doído e arrebatado. Há, em cada verso, filigranas que, recolhidas no luminoso título - "Bastidores" - desenham a figura do artista em sua solidão excessiva. Não à toa, Rodrigo Faour deu à biografia que escreveu sobre Cauby o título de Bastidores: Cauby Peixoto, 50 anos da voz e do mito.
Guardada no disco Cauby! Cauby! (1980), "Bastidores" canta o trágico, a lagrimalegria e a dor prazerosa na entrega diária e profunda do artista (completo: 24 horas por dia; todos os segundos) que não consegue separar privado e público, posto que um já foi suplantado pelo outro.
A persona criada para si por Cauby Peixoto, cantor da era do rádio, com toda as loucuras e consequências que essa era exerceu sobre os artistas, encarna como ninguém o sujeito de "Bastidores": "preso a canções, entregue a paixões que nunca tiveram fim", com diz a canção "Caçador de mim".
Deus e diva, o sujeito da canção chora até sentir dó de si. E o pior: diz (canta) isso para que o outro saiba e também se comova. Pura atitude romântica da diva que, rodeada de calmantes e excitante, mistura as instância do lar e do palco. Cantor popular, o sujeito leva a vida a cantar. Mas aqui cantar é chorar.
Ele encena o drama das emoções contrastivas: entre perder o amor daquela pessoa especial e ganhar o amor do público. Circular, a canção se apoia na melodia ora ascendente ora descendente para cantar o cotidiano da personagem que fala de si. Aliás, a melodia não se conclui, acaba na 5ª sugerindo o círculo infinito e vicioso de onde o sujeito não consegue sair.
A ênfase na dor é clara: figurativiza o sujeito na encruzilhada entre dois amores - cada qual com uma parcela do sujeito nas mãos. Cauby, além de narrar, dramatiza a dor na voz. A repetição do refrão ajuda a carregar nas cores fortes do sofrimento objeto do canto e seu dilaceramento.
A canção "Bastidores" reafirma a noção romântica de cantor: quanto mais sofre mais bonito canta. Evoca a figura do clown e do assum preto. Enquanto aquele reprime sua tristeza e faz graça para ver o riso do outro; este "num vendo a luz, ai, canta de dor", como sugere a canção "Assum preto", de Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira. A dor como motor do cantar.
O sujeito de "Bastidores" se constrói melodicamente; inventa-se diante dos ouvidos de quem lhe ouve cantar (chorar). Ele se traveste ("com muitos brilhos" e pinturas) para oferecer o melhor de si, mesmo em estado de penúria íntima; usa a máscara que não consegue mais tirar, pois está apegada à carne. Ele agora é todo canção e o sucesso é um mau necessário.
***
Bastidores
(Chico Buarque)
Chorei, chorei
Até ficar com dó de mim
E me tranquei no camarim
Tomei o calmante, o excitante
E um bocado de gim
Amaldiçoei
O dia em que te conheci
Com muitos brilhos me vesti
Depois me pintei, me pintei
Me pintei, me pintei
Cantei, cantei
Como é cruel cantar assim
E num instante de ilusão
Te vi pelo salão
A caçoar de mim
Não me troquei
Voltei correndo ao nosso lar
Voltei pra me certificar
Que tu nunca mais vais voltar
Vais voltar, vais voltar
Cantei, cantei
Nem sei como eu cantava assim
Só sei que todo o cabaré
Me aplaudiu de pé
Quando cheguei ao fim
Mas não bisei
Voltei correndo ao nosso lar
Voltei pra me certificar
Que tu nunca mais vais voltar
Vais voltar, vais voltar
Cantei, cantei
Jamais cantei tão lindo assim
E os homens lá pedindo bis
Bêbados e febris
A se rasgar por mim
Chorei, chorei
Até ficar com dó de mim
(Chico Buarque)
Chorei, chorei
Até ficar com dó de mim
E me tranquei no camarim
Tomei o calmante, o excitante
E um bocado de gim
Amaldiçoei
O dia em que te conheci
Com muitos brilhos me vesti
Depois me pintei, me pintei
Me pintei, me pintei
Cantei, cantei
Como é cruel cantar assim
E num instante de ilusão
Te vi pelo salão
A caçoar de mim
Não me troquei
Voltei correndo ao nosso lar
Voltei pra me certificar
Que tu nunca mais vais voltar
Vais voltar, vais voltar
Cantei, cantei
Nem sei como eu cantava assim
Só sei que todo o cabaré
Me aplaudiu de pé
Quando cheguei ao fim
Mas não bisei
Voltei correndo ao nosso lar
Voltei pra me certificar
Que tu nunca mais vais voltar
Vais voltar, vais voltar
Cantei, cantei
Jamais cantei tão lindo assim
E os homens lá pedindo bis
Bêbados e febris
A se rasgar por mim
Chorei, chorei
Até ficar com dó de mim
Muito bom descobrir que "Bastidores", não foi feita especialmente para Cauby. Mais, que ele se apropriou de tal forma da música, que impossível imaginar outra inspiração que não ele. Viva Cauby!
ResponderExcluirRealmente esta música é a cara do cauby,e esse artigo também é sua cara,isso é,ótimo.
ResponderExcluirE os homens lá pedindo bis,bêbados e febris,a se rasgar por mim.Enfim ,cauby revelado.
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