O comovente sermão anônimo O amor de Madalena, encontrado por Rainer Maria Rilke, começa dizendo que "Madalena, a santa amante de Jesus, amou-o em três estados. Amou-o vivo, amou-o morto, amou-o ressuscitado"; e termina observando que "Ela gosta mais de suas [do amor] privações do que de seus próprios dons e de seus favores". Madalena se alimenta de suspiros, de interditos, de pulsão e aniquilamento cíclicos.
Assim, penso, é o investimento da poesia: sempre fracassado e sempre gozoso, na tentativa de tocar o real, de desinstalar a vida. E assim também é o amor: nunca se completa (graças a deus!); tudo dá e nada pede. Claro que há um toque de ímpeto romântico aqui, mas ainda é preciso acreditar, penso, no amor.
Uma boa (e eficiente) obra de arte deve levar o fruidor a fazer conexões com outras obras e a ativar conhecimentos que, diante da nova obra, são colocados em questão. Carlinhos Brown, com sua inquietação contagiante, promove tais movimentações naqueles atentos à sua canção. Há um investimento no amor (sem rosto, sem nome: tropical e universal) que comove.
O sujeito da canção "Tantinho", de Carlinhos Brown (Odobró, 2010), aponta para uma alegria que, mais do que uma sensação, é um lugar. Independente do sujeito, a alegria é um espaço e uma projeção: uma geografia só atingida em coma de amor. Ou seja, o canto da vida (a canção que o sujeito compõe criando a sensação, no ouvinte, de que ela está sendo feita naquele instante da audição) é possível quando o indivíduo sabe que além do bem e do mal só há o bem e o mal: nada além, de uma ilusão.
É essa canção que faz o tempo passar doendo com menor intensidade. Para tanto, ela desliga a razão, fica odara, deixa os olhos livres. Eis que surge a exuberância: a poesia chove e o sujeito canta em línguas, tomado pelo espírito santo do amor.
No fundo, o sujeito de "Tantinho" cria uma genealogia afetiva da própria existência-de-si. Ele se ensaia: ele é mais uma função ("pro tempo passar") do que algo em si. Diz ao que veio: "Fiz essa canção (...) como sou feliz e sei que estou". A metacanção (canção que se autoficcionaliza, se autorepresenta) cria aproximações necessárias tanto à persona do sujeito, quanto à amada cantada, que é, noutro plano de interpretação, a própria vida.
Uma boa (e eficiente) obra de arte deve levar o fruidor a fazer conexões com outras obras e a ativar conhecimentos que, diante da nova obra, são colocados em questão. Carlinhos Brown, com sua inquietação contagiante, promove tais movimentações naqueles atentos à sua canção. Há um investimento no amor (sem rosto, sem nome: tropical e universal) que comove.
O sujeito da canção "Tantinho", de Carlinhos Brown (Odobró, 2010), aponta para uma alegria que, mais do que uma sensação, é um lugar. Independente do sujeito, a alegria é um espaço e uma projeção: uma geografia só atingida em coma de amor. Ou seja, o canto da vida (a canção que o sujeito compõe criando a sensação, no ouvinte, de que ela está sendo feita naquele instante da audição) é possível quando o indivíduo sabe que além do bem e do mal só há o bem e o mal: nada além, de uma ilusão.
É essa canção que faz o tempo passar doendo com menor intensidade. Para tanto, ela desliga a razão, fica odara, deixa os olhos livres. Eis que surge a exuberância: a poesia chove e o sujeito canta em línguas, tomado pelo espírito santo do amor.
No fundo, o sujeito de "Tantinho" cria uma genealogia afetiva da própria existência-de-si. Ele se ensaia: ele é mais uma função ("pro tempo passar") do que algo em si. Diz ao que veio: "Fiz essa canção (...) como sou feliz e sei que estou". A metacanção (canção que se autoficcionaliza, se autorepresenta) cria aproximações necessárias tanto à persona do sujeito, quanto à amada cantada, que é, noutro plano de interpretação, a própria vida.
***
Tantinho
(Carlinhos Brown)
Decunde Odá
Odara, Odara
Thiriririri Yara
Oh oh yeah
Dá, Odara, Odara
Thiriririri Yara
Fiz essa canção em coma de amor
Como sou feliz e sei que estou
Nunca amei ninguém um tantinho assim
Sem gostar de quem gostar de mim
Fiz essa canção pro tempo passar
Como estou só quero te abraçar
Se é ilusão desligue a razão
Pra bater feliz meu coração
Agora que subi ladeira, sossego
Que a poesia em minha horta, choveu
Eu te quero aqui
Bem-vinda à minha vida linda, calor
Você é vitamina, guia e é show
Vem grudar em mim
Por isso então dá-me tua mão
Por isso então dá-me tu amor
(So much Love)
Por isso então dá-me tua mão
(So much Love)
Por isso então dá-me tu amor
(So much Love)
Por isso então dá-me tu amor
Como I love you
Como I need you
E o meu coração só quer lhe amar
Como I love you
Como I need you
E só quer saber de andar colado
(Carlinhos Brown)
Decunde Odá
Odara, Odara
Thiriririri Yara
Oh oh yeah
Dá, Odara, Odara
Thiriririri Yara
Fiz essa canção em coma de amor
Como sou feliz e sei que estou
Nunca amei ninguém um tantinho assim
Sem gostar de quem gostar de mim
Fiz essa canção pro tempo passar
Como estou só quero te abraçar
Se é ilusão desligue a razão
Pra bater feliz meu coração
Agora que subi ladeira, sossego
Que a poesia em minha horta, choveu
Eu te quero aqui
Bem-vinda à minha vida linda, calor
Você é vitamina, guia e é show
Vem grudar em mim
Por isso então dá-me tua mão
Por isso então dá-me tu amor
(So much Love)
Por isso então dá-me tua mão
(So much Love)
Por isso então dá-me tu amor
(So much Love)
Por isso então dá-me tu amor
Como I love you
Como I need you
E o meu coração só quer lhe amar
Como I love you
Como I need you
E só quer saber de andar colado
5 comentários:
Essa música é realmente linda!!! Descobri ela tem um mes mais ou menos e fiquei super feliz quando a vi postada no blog!
Amei sua leitura de Tantinho! Eu procuro análises se músicas que gosto quando não encontro palavras pra materializar o que sinto. Com ela era assim, sentia uma alegria enorme, um acolhimento, mas não sabia expressar. Thanks. ;)
Esse compositor baiano quando acerta,acerta mesmo,"tantinho"é lindo demais.
Genial, parabéns! A música baiana nunca fez muito meu estilo, mas essa música me pegou.
Muito linda de verdade! !!
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