"Li um livro que falava de dois personagens que conviviam num colégio interno. No final do livro, descobre-se que são dois meninos. E eu achei a história superinteressante. Como nunca compactuei com esse preconceito besta que existe em relação a isso, escrevi a canção", explica Wando, em registro no livro História sexual da MPB, a cerca de sua canção "Emoções".
Aliás, importa dizer que a canção foi recolhida na coletânea (cd duplo) Sexo MPB (2010): recheada de "canções sensuais" e "músicas safadinhas", como define o organizador Rodrigo Faour.
Gravada no disco Gosto de maçã (1978), "Emoções" traz à tona o tema do amor e do sexo homoerótico (ainda hoje sob estigmas) no cancioneiro popular. A letra descreve o momento do encontro erótico entre dois parceiros do sexo masculino. O interessante é que, sem grilos, ainda vivendo das lembranças daquele instante, quem canta é uma das personagens da cena. O sujeito canta em primeira pessoa: ele é uma das partes da história contada.
Assumir a sexualidade (os desejos e as vontades) não é tarefa fácil. Daí a importância que esta canção exerce na história do amor e do sexo na canção brasileira. O sujeito canta, olhando para o parceiro, com as mesmas emoções sentindo, as outras (e novas) possibilidades que o lance dos dois oferece. Depois de um ter o outro, a vida faz sentido: "depois de ter você, para que servem as ruas?", parece ser a questão do sujeito.
Tarefa nada simples, a voz de Wando, com a sensualidade em tintas fortes, que carrega a pecha de brega, tem função importante na recepção da canção. Tendo criado e alimentado a figura do machão (algo cafajeste), Wando desestabiliza a audição: sua voz canta emoções diferentes daquelas que seu público (e os outros) estão acostumados a ouvir.
Aliás, se nenhuma coisa em si carrega qualquer valor, afinal somos nós que damos valor aos objetos do mundo, e assim criamos os (pre)conceitos, os palavrões, os "nomes feios" - que não passam de uma ficção cômoda à nossa incompetência diante do absurdo da existência - o que é algo brega? O que, no objeto, me faz categoriza-lo assim?
Sem dúvidas, os versos "até que a morte nos separe ou até o dia amanhecer, nós faremos nosso mundo, nós seremos tudo que devemos ser" é o núcleo da canção: do canto daquele momento vivido pelas personagens. Estes versos falam do amor que é eterno enquanto dura: tempo e espaço dos amantes - afirmação do sentimento, mas que passa a ser dividido com o ouvinte que, auditeur e voyeur, invade a intimidade deles. Como o poeta Glauco Mattoso já observou: "Quando dois homens discretos se juntam, a indiscrição dos outros duplica".
Os resíduos do amor romântico - um ser o rei do outro; o sexo suave e doce; o agasalhar nos braços - apenas reiteram a inexistência de vocabulário próprio para verbalizar as emoções novas e ainda sem normas. Há, de fato, a tentativa de romper com os interditos: fazer os destinos mutuamente interessantes.
O acompanhamento melódico, à base de cordas, dá a harmonia e a passionalização exatas daquilo que é cantado: a descoberta ("dois perdidos") de algo quente, terno e libertário - detalhes de uma vida que o sujeito canta aqui. Risos e prantos, de um rosto, de um corpo moreno, iluminado pela luz da lua se misturam: assim é a vida, ao final: encontros e desencontros - emoções diversas e paradoxais, mas que fazem as personagens não deixarem de amar e cantar o amor: aquilo que faz qualquer um voltar a ser menino livre.
Gravada no disco Gosto de maçã (1978), "Emoções" traz à tona o tema do amor e do sexo homoerótico (ainda hoje sob estigmas) no cancioneiro popular. A letra descreve o momento do encontro erótico entre dois parceiros do sexo masculino. O interessante é que, sem grilos, ainda vivendo das lembranças daquele instante, quem canta é uma das personagens da cena. O sujeito canta em primeira pessoa: ele é uma das partes da história contada.
Assumir a sexualidade (os desejos e as vontades) não é tarefa fácil. Daí a importância que esta canção exerce na história do amor e do sexo na canção brasileira. O sujeito canta, olhando para o parceiro, com as mesmas emoções sentindo, as outras (e novas) possibilidades que o lance dos dois oferece. Depois de um ter o outro, a vida faz sentido: "depois de ter você, para que servem as ruas?", parece ser a questão do sujeito.
Tarefa nada simples, a voz de Wando, com a sensualidade em tintas fortes, que carrega a pecha de brega, tem função importante na recepção da canção. Tendo criado e alimentado a figura do machão (algo cafajeste), Wando desestabiliza a audição: sua voz canta emoções diferentes daquelas que seu público (e os outros) estão acostumados a ouvir.
Aliás, se nenhuma coisa em si carrega qualquer valor, afinal somos nós que damos valor aos objetos do mundo, e assim criamos os (pre)conceitos, os palavrões, os "nomes feios" - que não passam de uma ficção cômoda à nossa incompetência diante do absurdo da existência - o que é algo brega? O que, no objeto, me faz categoriza-lo assim?
Sem dúvidas, os versos "até que a morte nos separe ou até o dia amanhecer, nós faremos nosso mundo, nós seremos tudo que devemos ser" é o núcleo da canção: do canto daquele momento vivido pelas personagens. Estes versos falam do amor que é eterno enquanto dura: tempo e espaço dos amantes - afirmação do sentimento, mas que passa a ser dividido com o ouvinte que, auditeur e voyeur, invade a intimidade deles. Como o poeta Glauco Mattoso já observou: "Quando dois homens discretos se juntam, a indiscrição dos outros duplica".
Os resíduos do amor romântico - um ser o rei do outro; o sexo suave e doce; o agasalhar nos braços - apenas reiteram a inexistência de vocabulário próprio para verbalizar as emoções novas e ainda sem normas. Há, de fato, a tentativa de romper com os interditos: fazer os destinos mutuamente interessantes.
O acompanhamento melódico, à base de cordas, dá a harmonia e a passionalização exatas daquilo que é cantado: a descoberta ("dois perdidos") de algo quente, terno e libertário - detalhes de uma vida que o sujeito canta aqui. Risos e prantos, de um rosto, de um corpo moreno, iluminado pela luz da lua se misturam: assim é a vida, ao final: encontros e desencontros - emoções diversas e paradoxais, mas que fazem as personagens não deixarem de amar e cantar o amor: aquilo que faz qualquer um voltar a ser menino livre.
***
Emoções
(Wando)
Nos fizemos tão meninos livres tão vadios de tanto querer
Nós fizemos poesia pra chorar do riso pra sorrir da dor
Me entregastes teus segredos
Eu falei do medo do meu coração
Assim pisamos noite a dentro
Como dois perdidos cheios de emoção
Nas almofadas tão macias
Nos aconchegamos sufocando a paz
Tudo então se fez ternura que nas nossas juras prometemos ser
Até que a morte nos separe ou até o dia amanhecer
Nós faremos nosso mundo nós seremos tudo que devemos ser
A lua iluminou teu corpo
Moreno, bonito, pra me provocar
No teu rosto um riso lento
Misturado ao pranto vi desabrochar
Te agasalhei nos braços, pele, mãos, espaços, acariciei
Te amei suavemente, e tão docemente, eu me fiz teu rei
(Wando)
Nos fizemos tão meninos livres tão vadios de tanto querer
Nós fizemos poesia pra chorar do riso pra sorrir da dor
Me entregastes teus segredos
Eu falei do medo do meu coração
Assim pisamos noite a dentro
Como dois perdidos cheios de emoção
Nas almofadas tão macias
Nos aconchegamos sufocando a paz
Tudo então se fez ternura que nas nossas juras prometemos ser
Até que a morte nos separe ou até o dia amanhecer
Nós faremos nosso mundo nós seremos tudo que devemos ser
A lua iluminou teu corpo
Moreno, bonito, pra me provocar
No teu rosto um riso lento
Misturado ao pranto vi desabrochar
Te agasalhei nos braços, pele, mãos, espaços, acariciei
Te amei suavemente, e tão docemente, eu me fiz teu rei
Eu achava que esta letra fosse autobiografica,que pena.
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